Por Richard Lira Borges
•
17 de outubro de 2023
A ação de usucapião é um poderoso instrumento para regularização da propriedade imobiliária, mas quando não utilizado no momento correto pode gerar frustrações e até mesmo ser julgada de forma improcedente. Por isso, torna-se imprescindível conhecer a situação real da pessoa que pretende ajuizar a referida ação, confrontando tal realidade com as previsões legais que fundamentarão o pedido. FUNDAMENTOS DA USUCAPIÃO – FUNÇÃO SOCIAL É verdade que existem diversas espécies de usucapião, porém todas elas terão um ponto de convergência comum. O primeiro deles é o objetivo dessa espécie de ação, qual seja, dar função social a propriedade. O legislador se preocupa que a propriedade atinja determinada finalidade, não se convertendo em algo inútil. Ora, uma das utilidades mais importantes nesse contexto é o direito de moradia. Por essa razão, a legislação sempre tende a favorecer o aquisição do imóvel por usucapião às pessoas que utilizam a propriedade com finalidade habitacional. Na prática, isso é demonstrado em prazos mais enxutos para aquisição de um imóvel que sirva como residência familiar. É o caso da ação de usucapião extraordinária, que tem seu prazo reduzido de 15 para 10 anos na hipótese informada, conforme previsão do art. 1.238, Parágrafo Único, do Código Civil. A finalidade social da sociedade impede o acúmulo especulativo e inútil de propriedade, dificultando o domínio egoísta e prejudicial à sociedade. Certamente o direito de propriedade deve ser respeitado, sendo eleito como direito fundamental em nossa constituição. Todavia, não se pode esquecer que a propriedade se refere ao vínculo entre pessoa e coisa (bem). Este vínculo deve ter utilidade, praticidade, efeitos reais e verdadeiros, não uma mera simulação. Daí o sentido de valorizar aquele que habita, que cuida, que torna a propriedade produtiva e útil. Isso não tem absolutamente qualquer relação com invasão ou roubo de propriedade alheia, posto que o usucapião somente será possível em caso de efetivo abandono da propriedade. Nesse contexto, o proprietário do imóvel que não faça uso direto do bem, pode alugá-lo ou emprestá-lo a terceiro, excluindo as chances de perder seu bem por uma ação de usucapião e mantendo a função constitucionalmente tutelada da propriedade. Em resumo, vê-se que é uma questão de diligência com o bem. Aquele que cuida e dá utilidade a propriedade não a perderá. Também abordamos o tema de direito fundamental de propriedade em outro texto. Caso tenha interesse em entender um pouco melhor a importância e a relação desse direito com sua vida, sugerimos a leitura para aprofundamento do tema. FUNDAMENTOS DA USUCAPIÃO – POSSE, PRAZO E UTILIDADE A função social é claramente a fundamentação que permite o ingresso da ação de usucapião, porém ela deve ser apurada através de requisitos objetivos, evitando que o pedido de usucapir se transforme em uma desordem social. Pensando nisso, o legislador atribuiu três importantes critérios para caracterizar a utilidade social. Quando alguém pensa em uma ação de usucapião invariavelmente lhe virá à cabeça a questão da posse, justamente porque o não exercício da posse pelo último proprietário dará causa a perda de propriedade. Assim, a posse é aspecto visual e facilmente perceptível de utilidade social da propriedade. Se alguém mora, trabalha a terra, constrói ou usufrui do bem imóvel de outra forma, estará configurada a posse, indispensável em todas as espécies de usucapião. Importante esclarecer que essa posse pode ocorrer de forma direta, quando a pessoa interessada habita ou utiliza a propriedade ela mesma, mas também indireta, quando a pessoa interessada permite que terceiros, mediante remuneração ou não, usufruam diretamente do imóvel. Com isso, não restam dúvidas que a exigência do legislador não está limitada ao uso direto, pois assim cada indivíduo não poderia ter mais do que uma ou duas propriedades. O prazo é outro fator indispensável, porém variável em sua extensão, conforme a espécie de usucapião eleita. O simples fato de ocupar um bem imóvel não concederá o direito de aquisição da propriedade. Pelo contrário, certamente uma ocupação precária fere o direito do verdadeiro proprietário, o qual poderá reclamar a devolução dos seus bens através de medida judicial adequada.